MAIS LIDAS

    postado em 17/11/2025 19:31

    A conclusão do ensino médio é a uma realidade para somente dois em cada dez entrevistados em um estudo divulgado nesta segunda-feira (17) com respostas de quase 4 mil pessoas envolvidas com o tráfico de drogas. Para mais que a metade, a frequência escolar termina antes do ensino médio.

    A baixa escolaridade declarada pelos entrevistados é um dos pontos que mais chama a atenção na pesquisa Raio-X da Vida Real, realizada pelo Instituto Data Favela, da Central Única das Favelas (Cufa).

    >> Leia também: Quase 60% sairiam do tráfico caso tivessem renda, aponta pesquisa

    O estudo analisou as respostas de 3.954 pessoas envolvidas com o tráfico de drogas. As entrevistas foram feitas pessoalmente, nos locais de atividade criminosa, no período entre 15 de agosto de 2025 e 20 de setembro de 2025, em favelas de 23 estados brasileiros.

    Nível de escolaridade declarado pelos entrevistados:

    • Ensino médio completo: 22%;
    • Ensino médio incompleto: 16%;
    • Ensino fundamental completo: 13%;
    • Ensino fundamental incompleto: 35%;
    • Sem instrução: 7%.

    O questionário trazia ainda a pergunta "Olhando para trás na sua vida, o que você teria feito de diferente?", e 41% relataram que teriam estudado ou se formado formado.

    “Além da importância da renda e de programas de empregabilidade dessas pessoas, elas reconhecem que o estudo teria sido o fator de mudança na sua vida. Elas teriam estudado mais e se formado no seu passado”, ressaltou o copresidente Data Favela e presidente da Cufa Global, Marcus Vinícius Athaye.

    “Programas e incentivos trabalhistas precisam vir aliados à Educação, principalmente, aliados aos tão jovens que já se arrependem de não ter estudado”, apontou ele durante entrevista coletiva em que os dados foram apresentados.

    Ainda no tema educação, o curso de nível superior que mais interessava aos entrevistados era Direito, que seria a escolha de 18% deles.

    Além disso, 13% escolheriam Administração; 11%, Medicina/Enfermagem; 11%, Engenharia/ Arquitetura; e 7%, Jornalismo/Publicidade.

    De acordo com a pesquisa, a falta de acesso à educação e a oportunidades de qualidade no mercado de trabalho são causas para que entre 6 ou 7 em cada 10 dessas pessoas não consigam ganhar acima de dois salários-mínimos de renda mensal.

    Famílias

    Sobre os arranjos familiares, 35% dos entrevistados declararam que foram criados em famílias tradicionais, e 38%, em famílias monoparentais ? das quais 79% são lideradas pelas mães, conforme constatam os números do Censo Demográfico IBGE 2022.

    A Pesquisa Raio-X da Vida Real identificou uma grande diversidade de modelos familiares baseados, especialmente, nas figuras femininas como as mães, tias e avós.

    Para os entrevistados, as pessoas mais importantes são a mãe (43%), os filhos (22%), a avó (7%) e o pai (7%). Além disso, 4% contaram não ter ninguém importante, e 6% não responderam.

    Sonho de consumo

    Para 28%, o maior sonho de consumo é ter uma casa. Em seguida, aparece o grupo de 25% que gostaria de comprar uma casa para a família, o que mostrou a preocupação dos entrevistados em ver a casa como ponto de segurança patrimonial da família.

    Os que têm entre 22 e 26 anos são os que mais gostariam de comprar uma casa para a família, com o percentual em 35%. A intenção cai para 27%, dos 27 aos 31 anos, e permanece até os maiores de 50 anos, com 30% preservando esse mesmo desejo.

    A ceo do Data Favela, Cléo Santana, disse que este sonho não é diferente do que tem o brasileiro médio sem nenhum tipo de envolvimento com o universo do crime.

    "O sonho da casa própria, o desejo de ter onde se instalar e para onde voltar, também é o principal sonho das pessoas que estão em situação de crime”, destacou.

    Saúde mental

    Outro fator que chama atenção na pesquisa são os problemas de saúde mental. Veja os mais frequentes:

    • Insônia: 39%;
    • Ansiedade: 33%;
    • Depressão: 19%;
    • Alcoolismo: 13%;
    • Crises de pânico: 9%.

    Entre os que sofrem de ansiedade, 70% ganham até um salário mínimo. Além disso, conforme aumenta o nível de escolaridade, o grau de ansiedade também sobe.

    “A prova disso é que 72% daqueles que iniciaram o ensino superior, mas não o concluíram, sofrem com ansiedade”, indicou a pesquisa. 

    Além da questão econômica marcada pela baixa remuneração, o alcoolismo, as drogas e a violência doméstica, apontados por 13% dos entrevistados, são motivos para a entrada no crime, de acordo com a pesquisa. 

    Segundo a coordenadora de pesquisas do Data Favela, Bruna Hasclepildes, a pesquisa concluiu ainda que a vida no crime é um reflexo da ausência de políticas públicas e de desigualdades, que há décadas atravessam pessoas negras e favelas do Brasil. “São estruturas que ainda se mantêm”, completou.

    Bruna destacou ainda que, diante da pergunta "Você sente orgulho do que faz?", 68% responderam negativamente.

    "É para desbancar mais uma vez o imaginário [de que gostam de se envolver com o crime]. Eles não sentem orgulho algum do que fazem. Essas pessoas não entram para este contexto porque querem, mas por necessidade”, explicou. “Eles têm a consciência de que exercem uma atividade que não é legal”

    Problemas do Brasil

    Ao identificarem os principais problemas do Brasil, os entrevistados apontaram, em primeiro lugar, a pobreza e as desigualdades, opinião de 42%, seguida pela corrupção, citada por 33%.

    A violência foi citada por 11%, e a falta de acesso à educação e à saúde, por 7% e 4%, respectivamente.

    Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:

    Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. Clique aqui e saiba mais.